quarta-feira, 10 de setembro de 2008

"Diga nomes!"

Muitas vezes me perguntaram “Que tal a Câmara?”, ou “Que tal ser vereadora?”, e eu respondi “um inferno”. “Não só por causa dos problemas que todo mundo conhece ou imagina, como a corrupção, nem pela dificuldade de lidar diariamente com o confronto de idéias, posturas e visões de mundo muito diferentes, mas sim porque o resultado do seu trabalho não tem nenhuma relação com o tamanho do seu esforço. Depende, sim, dos acordos que você for capaz de fazer. A organização da pauta e a votação de projetos em plenário depende exclusivamente de entendimento entre os autores, e não da qualidade e urgência do seu conteúdo”.

Depois de uma das entrevistas em que disse isso (à revista IstoÉ Gente), houve tensão e tumulto aqui na Câmara. “Tem corrupção? Então diga quem! Diga quando! Você será punida – por saber de corrupção e não ter denunciado, o que era o seu dever. Ou por ter feito acusações falsas, o que é crime”.

A reunião do Colégio de Líderes, à qual eu não estava presente, foi tensa. Alguns vereadores disseram, furiosos: “A santinha! Fuma maconha e vem falar de corrupção”, me contaram colegas. No plenário, o tom foi "melhorzinho": “Eu sou a favor da família, sou contra as drogas.(...) Queria saber o que a vereadora quis dizer com essas acusações”, disse um vereador no microfone de aparte.

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Naquela ocasião, respondi: “Por acaso os senhores não sabiam que na política tem corrupção, de várias maneiras? Não somos procurados para “dar um jeito”, “quebrar um galho”, passar alguém adiante na fila?”. Nem me lembro mais que exemplos dei na época.

“A senhora sabe ou não sabe de algum caso concreto de corrupção envolvendo vereadores da Casa?”. “Se eu soubesse, já teria feito a denúncia à Corregedoria”. Claro que saber sem provas, por ouvir alguém contar, não serve – e alguém aí nunca ouviu, de fontes próximas ou distantes? Em todo caso, não, eu não tenho provas contra nenhum vereador. E eu nem estava falando de corrupção na Câmara, especificamente, mas na política de modo geral. E aí se incluem todos os Parlamentos, o Poder Executivo, os Tribunais de Contas, os partidos, o diabo.

“A vereadora disse que nenhum vereador desta Casa é corrupto. Eu estou satisfeito com a resposta”, disse um colega. Não foi isso que eu disse, mas depois de entender a entrevista a seu modo, resolveram interpretar também a minha declaração em plenário de modo peculiar. “Tem corrupção” tinha virado “todos são corruptos”; “eu não tenho dados concretos” virou “eles não existem”.

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O Corregedor me pediu explicações por escrito, eu dei. Os membros da Corregedoria aceitaram a explicação e o caso se encerrou ali.

Ou quase: alguns dias depois, o presidente veio cobrar o fato de eu ter assinado a lista de presença sem que ele tivesse me visto no plenário. “Eu vim até aqui, vi que não estava acontecendo nada de relevante e subi para minha sala, de onde acompanhei a sessão pelo monitor de TV”. “Mas então você não estava no plenário e assinou a lista? Você não é a honesta?”. Fiquei com tanta raiva que risquei meu nome da lista.

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Depois e antes daquela entrevista, já me queixei mais mil vezes sobre o modo de funcionamento do Parlamento. Em palestras, no plenário, na reunião do Colégio de Líderes, em audiências públicas aqui mesmo na Câmara, muitas vezes na presença de outros vereadores. E sempre ouvi dos colegas o que ouvi ontem também no plenário: “É assim aqui ou em qualquer lugar do mundo”. Como se o Parlamento fosse um planeta isolado, com uma lógica à parte, sem necessidade de responder ao mundo exterior.

Já durante a campanha eleitoral, em entrevista à Band News, eu falei de novo: “Os projetos não são aprovados em função de serem bons ou ruins, e sim como resultado de acordos, em que sempre se estabelece algum tipo de troca”. (Veja um post sobre isso aqui). Já havia falado à CBN e a diversos jornais.

Sexta passada, falei na Sabatina do Estadão – acrescentando (não pela primeira vez) que essa troca pode ser mais republicana... ou menos. Na pior das hipóteses, a troca envolve vantagem financeira direta ou indireta. (Direta: “Pague que eu aprovo seu projeto”. Indireta: “Nomeie um cara meu que eu aprovo”, e o “cara meu” vai comandar algum esquema ilegal de arrecadação de recursos, ou devolver parte do seu próprio salário para o político em “agradecimento”, etc., etc.). Será que existe hipótese ainda pior? Bom, há lugares pelo Brasil em que os pedidos podem ser mais pesados, tipo "a cabeça de fulano" (literalmente).

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Não é raro alguém mais velho e experiente fazer cara de desdém: "Tolinha, e você não sabia que era assim?". Não, eu não sabia que as votações eram TODAS combinadas antes. Que o projeto só é votado quando já se sabe o resultado. Que os vereadores não decidem ali, em função de seu próprio juízo, votar "sim" ou "não", mas seguem o que foi combinado pelos líderes. "Votem sim!", grita o líder de um lado. "Votem não!", grita o líder do outro bloco. Parece que há uma tremenda disputa em curso; se houver público nas galerias, ficarão apreensivos, querendo saber quem vai ganhar. Mal sabem que só falta acertar o placar exato, porque a coluna (1 ou 2) já está definida. A vitória pode ser por 40 X 12, 34 X 10... Mas a Sessão foi aberta já com o conhecimento de quais projetos seriam aprovados, quais seriam adiados, quais seriam derrubados.

Também não sabia que o presidente das Comissões não era eleito por seus pares, mas decidido pelos mesmos líderes. "Constituição e Orçamento ficam com o Centrão, Saúde é do PT, Educação também... O PSDB não vai presidir nenhuma porque rompeu acordo". Não sabia, porque no dia da eleição dos presidentes, os vereadores declaram seu voto como se ele fosse totalmente espontâneo: "Voto em meu colega, grande vereador, fulano de tal". Alguns, mais contrariados, deixam registrado: "Seguindo deliberação da bancada, voto em fulano". Quem é da Casa sabe que essa é uma suave manifestação de descontentamento - que é aceita porque não foi explícita e porque, afinal, respeitou-se a disciplina partidária, o acordo entre os líderes.

“Juuura que não sabia? Tsc, tsc”. Uai, eu acompanhava a política pelos jornais. Se quem sempre soube de tudo não contou, como é que eu ia adivinhar?

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Pois é, dizer que votações são decididas na base de trocas e reciprocidades não é novidade nenhuma – novidade é dizer que é SEMPRE assim. Mas dizer que tem gente que até cobra $$ para votar assim ou assado é tão revelador quanto contar que a primavera vem depois do inverno. Mas, de novo, causou rebuliço.

Agora, tanto os vereadores quanto os jornalistas cobram: “Dê nomes! Dê nomes!”. Parece que, sem contar quem foi, quando, onde, por quanto, por que, não se pode dizer “tem gente que vende voto” – sob pena de ser cassada ou, quem sabe, “apenas” desmoralizada. Não, não vou dar uma de louca, não vou sair dizendo “eu sei, eu vi, eram 30 mil reais por mês!”, como fez o Roberto Jefferson (e não eram 30 mil reais por mês...). Não, porque eu não sei quem, quando, onde, por quanto. Nunca fui convidada para conversas secretas em que se discutiam valores.

Mas presenciei inúmeras discussões de pauta em que os vereadores diziam alto o suficiente para qualquer um ouvir: “Não vamos votar nenhum projeto do governo. O prefeito tá sem moral na Casa. Não aprovou meu projeto/ não executou nossas emendas/ não atendeu meu pedido”. Aliás, isso já foi dito em plenário, no microfone. “Se o prefeito quer aprovar projeto aqui, vai ter de conversar com a gente. Ser da base do governo tem um ônus; tem de ter um bônus”.

Em Brasília, noticia-se com a maior naturalidade que o PMDB quer cinco ministérios, que não sei quem exige a diretoria de uma estatal, que é preciso liberar não-sei-quantos cargos de segundo escalão... O líder do PR na Câmara reclamou, quando o governo anunciou contingenciamento de recursos depois da não-prorrogação da CPMF (uma das raras votações “sem acordo” nos últimos tempos): “Se não for executar nossas emendas, vamos ter de voltar a falar em cargos”.

Pois bem, muitos ficam horrorizados com as palavras “vender” e “dinheiro” relacionadas a “votar”. “Quem vendeu, quem?!”. (Catz, alguém aí já ouviu falar em Valerioduto e outras “mesadas”? Em anúncios da Nossa Caixa?) Justo essa parte não é novidade. (O que eu não sabia, e aprendi aqui na Casa que é possível, é que às vezes se pede dinheiro para DEIXAR DE VOTAR um projeto – que já é apresentado justamente pra isso, para apavorar alguém (um setor, um grupo) a tal ponto que esse alguém topará pagar para evitar que aconteça).

Realmente, é horrível. Mas e o resto, tudo bem? Os acordos, a inevitabilidade de se estabelecer algum tipo de troca...É normal? O fato de alguns projetos bons ficarem anos e anos e anos e anos estacionados enquanto outros menos importantes logo vão a votos, de modo que cada vereador tenha um projeto aprovado e todos fiquem felizes... É ok? O fato de o governo – todo governo – ter de entregar alguma coisa para que um projeto considerado relevante seja aprovado; de um projeto considerado ruim pelos vereadores ser aprovado porque eles receberam algo em troca, é aceitável? Já estamos todos tão calejados, tão ásperos que já achamos que tudo bem se ficar só nisso?

Bom, se só eu não me conformo, aí o Apolinário tem razão: tem pessoas que até podem ser boas jornalistas, boas comentaristas esportivas, mas não sabem ser Parlamentares. Não servem para isso.

A Educação, a falta de educação e a perda momentânea da noção

A culpa, pra variar, é do mordomo.

Caiu o marqueteiro do Alckmin. Parece que há um consenso de que a propaganda eleitoral é “muito ruim”.

Eu não tenho muita paciência para Horário Eleitoral, mas já assisti algumas vezes. Sei lá, me pareceu um programa tucano como todos os outros... Talvez com menos brilho técnico, mas é o Alckmin de sempre, com o discurso de sempre...

(Uma diferença me chamou bastante a atenção: agora o Alckmin aparece nas fotos oficiais com a cabeça toda. Antes, cortavam o retrato na altura da testa, e a parte careca não aparecia... Eu não me importo a mínima com essas coisas, mas os marqueteiros se importam muito. Vacilaram?)

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O marqueteiro, por sua vez, caiu atirando – no vilão de sempre, o Serra. Afe.

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Ontem, no debate sobre educação do movimento Nossa São Paulo, havia dois tucanos à mesa: o Secretário da Educação do município, Alexandre Schneider, e o deputado federal e ex-ministro da Educação, Paulo Renato de Souza.

Schneider fez um bom trabalho – bem melhor, aliás, do que o antecessor, e nisso reside uma das muitas ironias dessa aliança fraturada (DEM-PSDB).

Quando o prefeito era tucano, o Secretário era Democrata (o Pinotti). Com a melhor das intenções, quis implantar, de um dia para o outro, o período integral nas escolas, com o programa São Paulo É Uma Escola.

Não deu nada certo. Por um lado, porque você não consegue resolver estes problemas todos ao mesmo tempo: a lotação das salas de aula (a média no município não é ruim, é de 33 alunos – mas é média, o que significa que em alguns lugares tem mais do que isso), o número de turnos por escola e o tempo de permanência em sala de aula.

Assim, com o número de escolas e salas existente, para as crianças ficarem o dia todo na escola, implantou-se o caos – imagine o serviço da merenda como ficou... Os pátios...

A Sala de Informática, que era usada no período de aula, virou espaço para atividades no contra-turno. Os professores que vinham usando o computador no processo de aprendizagem arrancaram os cabelos. O mesmo ocorreu com a Sala de Leitura.

Enfim, um desastre – agravado pelo fato de que o programa foi instalado na base do “cumpra-se”. Sem discutir, sem perguntar nada para os professores, sem ouvir as queixas ou sugestões deles, sem respeitar as diferenças entre as escolas.

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Entrou o prefeito Democrata, veio o Secretário tucano – e tudo mudou. A maior das qualidades dele é ter a maior disposição para escutar. Para fazer milhões de reuniões com os sindicatos para definir a reestruturação da carreira, por exemplo. Com representantes da classe artística que pediam uma política de ocupação dos teatros dos CEUs baseada na publicação de editais. Com os preocupados com a continuidade do programa Educom.radio. Secretário que inúmeras vezes pediu opiniões da Secretária do governo Marta, a Cida Perez. Que foi a um debate na quadra da União de Moradores de Heliópolis e bancou um projeto muito legal que unirá vários equipamentos públicos (creche, escola estadual, escola municipal, praça) e criará alguns (como uma escola técnica estadual, quadras, etc.), ignorando olimpicamente a recomendação de alguns colegas dele: “Fazer o que lá? É tudo petista... Você vai ver que não vai adiantar nada, no fim eles votam tudo no PT”.

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Nessa gestão, algumas medidas simples ajudaram a diminuir o absenteísmo – que, como o sufixo indica, não é sinônimo de falta justificada, mas de exagero, abuso, falta de comprometimento. E os professores finalmente conseguiram algo que reivindicavam há tempos: a incorporação de gratificações sobre o vencimento-base. Por que é tão importante? Porque a gratificação pode, em tese, ser suprimida de um dia para o outro (ninguém seria louco de fazer isso, em todo caso...); porque o vencimento serve para cálculo de vários benefícios; porque ele é (e será) o valor da aposentadoria.

Claro que a categoria não ficou 100% satisfeita, mas não pode negar que foi um avanço.

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Em um de seus primeiros esforços para ouvir os professores sobre o São Paulo É Uma Escola, o Secretário pediu comentários (críticas, sugestões) por escrito.

Em um debate na faculdade Cásper Líbero, uma professora da rede municipal veio se queixar comigo sobre a falta de diálogo com o governo. “Ué, mas o Secretário está pedindo para as escolas se manifestarem!”. “É nada, é só pra constar. A gente manda pra Coordenadoria e a coordenadora não encaminha nada, faz um relatório dizendo “aqui na nossa região está tudo ótimo, ninguém tem críticas”. É tudo mentira”.

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Tem muito disso por aí. (Eu ia escrever “no setor público”, mas lembrei de uma história dos tempos de MTV. Éramos seis pessoas no departamento de produção, que fazia os textos de todos os programas com VJs – 3 produtores e 3 assistentes, eu e mais duas. Uma das produtoras saiu depois de brigar com o chefe. Já trabalhávamos muito – não havia internet, nem ao menos computador. Buscar informações sobre os artistas era tarefa para garimpeiros. Eu chegava às 10:30 e saía às 2 da manhã. Com a saída dela, piorou. As tarefas foram redistribuídas “enquanto não se contratasse alguém”. Passava o tempo, e nada. Pedíamos socorro: “Tá muito difícil, muito pesado!”. O chefe dizia: “Eu estou pedindo uma contratação, mas a direção não está liberando a vaga”. “Como não está liberando? A vaga já existia!”. “Estou tentando...”. Uns quinze dias depois, houve reunião na diretoria. Fiquei sabendo pelo chefe de outro departamento que, diante de um apelo geral para “enxugar despesas”, nosso chefe declarou o seguinte: “Eu eliminei uma vaga na produção e está tudo funcionando muito bem”).

Enfim, a coordenadora achou por bem mentir para o chefe – imaginando que era nisso mesmo que ele estava interessado, em um termômetro falso da satisfação das pessoas... Como se fosse super, super útil dizer “aqui vai tudo muito bem”, com todo mundo infeliz.

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Ele teve vários problemas com coordenadores – por exemplo, ao desligar alguns que haviam sido nomeados por vereadores da base governista, sem nenhum critério de qualificação para o cargo. Fez questão de consultar os profissionais da região para indicar servidores com real conexão com a rede.

Em represália, vereadores da base governista foram pra cima dele na Câmara, convocando-o para dar explicações sobre isso e aquilo nas Comissões. O pior é que quem vê pensa: “Puxa, que comportamento republicano, eles estão pegando no pé do Secretário do seu próprio governo!”.

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As melhores intervenções no debate foram as do Schneider, que representava o Kassab, e da Cida Perez, falando em nome da Marta.

Claro que, em um debate sobre o programa de governo dos candidatos para o qual os próprios foram convidados, a presença de representantes é uma decepção, e dá impressão de descaso (pode ter sido ou não). Mas o fato é que a discussão foi muito melhor com eles do que teria sido com os titulares. Marta e Kassab ficariam se cutucando, se acusando, trazendo à mesa outros assuntos, fazendo ironias. Mesmo que não fossem lá dispostos a isso (se é que é possível), ao menor movimento de um, o outro reagiria no mesmo tom. Mas o Secretário e a ex-Secretária falaram de coisas bem concretas.

Ele disse quantas vagas em creches havia no final do governo Marta e quantas há agora – um crescimento considerável nessas duas gestões em relação às anteriores (Maluf e Pitta). Mas o número de crianças não atendidas ainda é gigantesca – em parte, porque o nível de emprego cresceu, especialmente entre as mulheres (o que ele atribuiu à estabilidade econômica do governo Lula...), e a demanda aumentou mais do que a média dos últimos anos. Para atender a ela, seria necessário construir 600 novas creches – coisa que não se faz da noite para o dia (e não é só um problema de grana, mas muito mais de falta de lugar). O governo lançou, então, um edital de PPP, Parceria Público Privada, prevendo que o setor privado adquira terrenos, construa, e a prefeitura possa então usar as instalações.

Cida Perez falou da possibilidade de realização de concursos regionalizados, o que acho ótimo. O processo de seleção de professores precisa ser muito aprimorado. Não pode ter um “provão” e acabou, depois é só distribuir os professores pelas escolas.

Já o Paulo Renato, representando o Alckmin, foi incrivelmente vago. Uma das coisas mais concretas que falou foi sobre a dificuldade para encontrar áreas para construção de novas escolas (se não a única). De resto, o incontestável de sempre: “nosso programa prevê a ampliação do número de vagas em creches e escolas de educação infantil”; “é preciso melhorar a qualidade do ensino”; “educação é a chave para um país melhor”, essas coisas.

Renato Reichman defendeu suas teses sobre a importância dos primeiros anos de vida; Ivan Valente bateu na tecla do orçamento e do número de alunos por sala; Edmilson Costa falou sobre qual deve ser, em sua opinião, o papel, o objetivo da educação. Dos três, ele foi o que eu mais gostei.

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“Por que chegamos a esse estado de coisas tão ruim na educação?”, me perguntaram. Não tem uma resposta só. Por desleixo, por exemplo, com as instalações – a parte mais fácil de todas de resolver. Entre tantas outras questões complexas, reformar os prédios, transformá-los em lugares decentes, convidativos e acolhedores, dotá-los dos recursos mínimos para o desenvolvimento das atividades educacionais é o de menos. Mas a rede municipal tem problemas, e a rede estadual quase que é só problema. Alguns dos prédios públicos mais horríveis em que estive nos últimos tempos são escolas estaduais. O pátio do (bom) presídio feminino Talavera Bruce, no Rio de Janeiro, é mais simpático do que o de uma escola que visitei em Mauá (Grande São Paulo) em 2005 – este parece mais uma cadeia do que aquele.

Mas boas instalações não resolvem tudo – os CEUs são lindos mas a qualidade de ensino das escolas dos CEUs, nem sempre.

O preparo, as condições dadas e as exigências feitas aos professores também têm problemas sérios. E decorrem, às vezes, de outras carências. Quando um biólogo, matemático, engenheiro, só presta o concurso público porque não conseguiu emprego na sua área e não porque quer ser professor, fica difícil ter um bom desempenho em sala de aula.

E tem a desigualdade, a miséria, a falta de segurança, o desemprego, a desatenção à saúde, o desamparo psico-social...

A Vejinha desta semana trouxe uma matéria muito mais interessante do que foi o debate sobre Educação no aniversário de 40 anos da nave-mãe: professores que dão aula em boas escolas particulares e em escolas da rede pública relatam a diferença de experiências. Vale a pena ler.

Alguns trechos:

“Certa vez, [a professora Débora da Costa, que trabalha no conhecido “Gracinha”, no Itaim, e no Jardim Ângela] convocou a mãe de um aluno bagunceiro para relatar os problemas que estava tendo. No dia seguinte, soube que o menino de 9 anos havia levado uma surra em casa por causa da queixa”.

“Na prática, a presença de um professor capacitado parece não ser suficiente para garantir o aprendizado. Além das notórias carências na infra-estrutura da rede pública, o contexto familiar é um fator decisivo na evolução de uma criança ou adolescente. “Nos colégios privados, quando os alunos têm dificuldades os pais contratam professores particulares ou psicólogos”, comenta Laís Carvalho [outra professora]. Na rede pública isso é mais raro”. Para piorar: “Uma das minhas alunas, de 10 anos, precisa limpar a casa todos os dias porque a mãe trabalha fora”, diz Laís. “Não tem tempo de fazer as lições”.

Eles também fazem comparações entre a independência forçada dos alunos da escola pública – um número muito maior deles volta sozinho para casa, em comparação com os de escolas privadas. Isso se reflete na postura em sala de aula.

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Eu me bato muito na história das distâncias. Se uma mãe precisa sair de casa às cinco da manhã e só chega às oito da noite, porque passa seis horas na condução indo e voltando do trabalho, seus filhos precisam de cuidados alheios por 15 horas. Não há sistema de educação que dê conta satisfatoriamente, por melhor que ele seja.

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Agora o pessoal da campanha do Alckmin, nesse movimento clássico de culpar o Serra por tudo o que ele não consegue fazer (tipo se eleger presidente), vem com a seguinte tese: “Segundo interlocutores, não há mais clima para pedir a Alckmin que evite o confronto direto com o democrata. Kassabistas se empenharam nas últimas semanas para impedir que Alckmin atacasse a atual gestão. O temor era de que a briga entre antigos aliados acabasse naufragando a possibilidade de DEM e PSDB voltarem a se coligar no segundo turno”.

Peraê, vamos colocar as coisas em ordem:

1) Se os “kassabistas se empenharam” eu não sei; o que eu sei é que o Alckmin escolheu, desde o começo, atacar a atual gestão. Que é MUITO MAIS TUCANA do que “kassabista”. Secretários tucanos: Educação, Assistência Social, Saúde, Planejamento, Participação e Parcerias, Coordenação das Subprefeituras, Governo, Esporte... Fora os não-tucanos que foram nomeados pelo Serra e ficaram, como Eduardo Jorge (meio ambiente) e Calil (Cultura). E outros. É muito louco terem de pedir para o Alckmin não atacar a gestão deles... Criticar? Ok. Mas descer o pau é demais...

2) O temor era o naufrágio da aliança no segundo turno? Ah, vá! O pior é que certamente essa análise é feita com base nas vaidades e orgulhos, mágoas e birras da política, quando deveria ser escorada em outra constatação lógica: se no segundo turno o Alckmin espera (esperava?) o apoio do Kassab e dos kassabistas, qual o valor desse apoio depois de detonar a gestão do próprio? “Olha, eles foram uns baita de uns incompetentes, mas agora me apóiam e por isso eu conto com seu voto”.

É, pensando bem, talvez seja mesmo o caso de demitir o marqueteiro.

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Ah, como é bom se ocupar dos problemas dos outros momentaneamente, e deixar os nossos de lado! :o) Depois eu escrevo sobre a Câmara...